Os amigos sem filhos não se lembram de nós
Não é por mal, a sério que não. Eu própria, antes de ser mãe, já fiz o mesmo e garanto-vos que é um fenómeno inconsciente. Tal como não nos lembramos do amigo que detesta sushi se o programa é ir ao japonês, também não nos lembramos do amigo com filhos se o programa é ir ao Lux até às 6 da manhã. É perfeitamente legítimo.
Mas há outros motivos para ajudar à festa. O primeiro é que quem não tem filhos não tem horários. Tanto janta às oito como às onze, tanto vai para a praia ao meio-dia como à meia-noite, tanto lhe faz andar ao sol como à chuva e não tem muita paciência para condicionar a sua vida em função dos horários de pais de filhos pequenos.
Segundo, quem não tem filhos, como deixa de ver os recém-pais nos circuitos habituais (restaurante preferido, café do costume, concerto do momento), assume que não vale a pena fazer o convite porque de certeza que não vai ser aceite. Mesmo eu já assisti a conversas do tipo, “Devíamos dizer alguma coisa à Fulana”, “Deixa estar, ela tem o bebé, de certeza que não pode ir”. E, na verdade, é provável que oito em cada dez convites sejam efectivamente recusados, sobretudo por fenómenos imprevistos como: não arranjar baby-sitter a tempo, a criança acordar nesse dia cheia de febre ou ter dado uma noite horrível, daquelas que nem cinco cafés conseguem dar genica aos progenitores. Mas há todas as outras vezes em que os recém-pais não só podem, como desejam ardentemente ter um serão sem ver o BabyFirst.
Por fim há a (má) fama que as mães aleijadas criaram. As mães aleijadas são uma espécie muito comum, que consiste em mulheres que eram normais até terem um rebento mas que agora acham que a vida deve girar em torno do mesmo. Não há conversa que não comece em fraldas e não acabe em dicas sobre como encontrar o colégio perfeito. Ora quem não tem filhos, não podia estar menos interessado em qualquer um desses temas. Aliás, mesmo quem tem filhos, na maior parte das vezes, quer mesmo é aproveitar uma saída com amigos para não falar deles. Resumindo, os amigos já levaram tantas secas sobre crianças, sobretudo porque quiseram ser educados e perguntar como estava o Júnior, que ficaram traumatizados e agora fogem a sete pés de qualquer casal que anuncie uma gravidez.
Por isso mães e pais que se sentem negligenciados, não fiquem tristes nem ofendidos com os vossos amigos. Eles amam-vos muito e daqui a uns anos voltam a telefonar. Nem que seja para perguntar qual é a melhor marca de cadeirinha automóvel. Aí volta tudo a ser como antes, mas agora com montes de miniaturas na mesa do lado.
E quanto a vocês, jovens amigos livres e descomprometidos: aproveitem. Durmam até ao meio-dia sempre que poderem, saiam para jantar às onze da noite, vão de fim-de-semana à última hora, acima de tudo sejam espontâneos. Por daqui a uns meses ou anos, essa coisa de decidir ir beber um copo às dez da noite vai acabar. A não ser que seja um copo de leite.
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