À segunda é mais difícil

Embora a gravidez seja uma das alturas mais bonitas na vida de uma mulher, confesso que não sou fã da coisa. Sim, há todas aquelas experiências maravilhosas como o facto incrível de estar a gerar uma vida, sentir o bebé a mexer, ouvir o seu coração quando vamos às consultas de obstetrícia ou passar à frente na fila do supermercado, mas sinceramente, tudo o resto é um rol de interdições, indisposições e preocupações. Ora é verificar se a salada está bem lavada, ora é acordar duas vezes por noite porque a bexiga não aguenta, ora é ter de dizer não àquele segundo copo de vinho. Tudo isto ao mesmo tempo que se lida com uma profunda desregulação hormonal que nos transforma em seis mulheres diferentes durante as mesmas 24 horas: de chorona a irascível, de impaciente a ansiosa, de meiga a intolerante. (Nota para os maridos que gostavam de ser poligâmicos: esta é a altura da vida em que vão ficar a saber porque é que a poligamia NÃO resulta. Uma mulher é suficiente para vos dar cabo da cabeça.)

Se tudo isto já é complicado quando podemos chegar a casa e descansar no sofá (sim, porque uma grávida sente-se inevitavelmente mais cansada e não é por acaso que existem filas e lugares especiais para elas), o verdadeiro desafio começa quando já se tem um filho. O irmão mais velho do belíssimo ser que estamos cuidadosamente a gerar não se compadece com o nosso estado de graça. Aliás, na maior parte das vezes, parece uma daquelas pessoas que refilam se uma grávida lhes passa à frente. Não percebe porque é que não podemos dar colo, porque é que não rebolamos no chão, porque é que já não partilhamos a mesma colher. Além do mais, se tiver menos de quatro ou cinco anos, ainda é, ele próprio, um bebé: tem de ser vigiado, alimentado, vestido (com roupas que realmente combinem e sejam adequadas ao estado do tempo) e repreendido.


E é então que uma mãe passa a viver os meses de gravidez entre o "Estou tão feliz, era mesmo isto que eu queria!" e o "O que é que me passou pela cabeça para engravidar outra vez?". É um sentimento perfeitamente natural. Porque estamos mais cansadas, mais preocupadas e, sobretudo, mais conscientes do que é ter um recém-nascido. Torna-se inevitável ficarmos assustadas com a gestão do tempo e da família quando o novo elemento chegar. Ainda estão muito frescas na memória as noites mal dormidas e a rapidez com que o tempo passa quando se está em casa com um ser que aparentemente não dá trabalho nenhum. Quando nasceu o meu primeiro filho, tive uma crise de exaustão ao fim de dez dias - dores no corpo, arrepios, falta de apetite - o que me faz entrar constantemente em pânico com a ideia de passar por tudo outra vez, e agora com uma criança de dois anos e pouco a querer constantemente a minha atenção. Mas depois, olho para o seu álbum de bebé, sinto outro pontapé nas entranhas e sorrio de plena felicidade. Que sorte poder passar por esta experiência outra vez! É um estado um bocado esquizofrénico. Ou se calhar é das hormonas...


Comentários

  1. Maravilhoso! Magnífico! Sem tirar nem pôr! bjs Filipa

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  2. Filipa, eu também só conheci o seu blog por causa da notícia, fartei-me de pesquisar qual seria o blog e ainda bem que a encontrei, porque gosto da forma como escreve e desde já agradeço o livro enviado. Quanto a este post, o estado de graça de uma mulher grávida é tudo menos engraçado, tem os seus momentos do dia de ternura, felicidade, mas depois há todas as preocupações que nos são intrínsecas como mulheres e mães. Quanto ao irmão é sem dúvida a idade ideal para a chegada da mana, as minhas têm diferença de 6 anos, e a ciumeira da mais velha é tremenda e não foi nada fácil, mas lá está, têm os seus momentos de ternura e de não se poderem ver uma à outra, mas no fundo adoram-se. Continuação de um estado de graça maravilhosamente engraçado e que tudo corra muito bem.

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    1. Gostei do estado de graça tudo menos engraçado :) No final, cada minuto vale a pena. um beijinho

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  3. É um estado maravilhoso, não é? E perfeitamente contraditório! Se, por um lado, a mulher sente-se cansada, exausta, rebentada psicologicamente, por outro sente aquela plena felicidade de quem gerou uma vida. E digo eu isso, apesar de não ser pai e achar que não devo ser pai nos tempos mais próximos.

    É a lei natural da vida, a forma como está organizada a maternidade e a própria experiência humana. No entanto, também acho que esse grau de exaustão pode ser combatido. Nos primeiros tempos da maternidade, há aquele período em que a mulher e o pai têm oportunidade de estar mais tempo em casa devido às licenças de maternidade e paternidade. Mas, depois, quando se tem dois ou três filhos e, ainda por cima, se trabalha, torna-se uma vida complicada. É preciso uma boa gestão de tempo e mais flexibilidade na forma como se encaram os problemas. Faria bem à nossa sociedade pensar na forma como gere a forma como regula o trabalho: mais produtividade, com a sua dose de exagero workaholic / ou uma vida mais saudável, ecológica, com atenção e mais tempo para aqueles que mais amamos? São questões que podem dar ainda mais beleza à maternidade e à paternidade e criar uma sociedade diferente, mais saudável e menos económica.

    Muitos beijinhos
    Jorge

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  4. Olá eu estou na mesma situação um menino de quase 21 meses e grávida novamente e lá está ele ainda é um bebê. Adoro o seu blog faz mesmo as minhas palavras os meus sentimentos.

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  5. Grande texto! É exactamente isso!! :-DD

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  6. Definitivamente fui mae de tres maravilhosos rebentos numa altura completamente diferente... Nem sequer havia licenca de parto e do Segundo tive de voltar para o trabalho ao fim de um mes. Ja da ultima. tive a sorte de ter 3 meses para aproveitar... So' que antigamente nao havia tanta informacao. Tinhamos os filhos, talvez passassemos por todas estas emocoes mas acho que nunca tive oportunidade ou talvez tempo para as analisar... Mas para mim tudo comecou ha quase 42 anos, que e' a idade do mais velho... Continue a escrever. Adoro ler as suas cronicas e vou comprar o seu primeiro livro, pois adorei o Segundo que teve a amabilidade de me oferecer. Um abraco e "enjoy" como dizem os ingleses... Ainda nao consegui encontrar uma palavra portuguesa que consiga definer realmente este termo.

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    1. Não imagino o que seja ir trabalhar após um mês do nascimento... Eu demorei mais que isso a conseguir voltar a saber que dia da semana era! :) Um beijinho e obrigada pela mensagem

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    2. eu comecei a trabalhar após quatro meses e continuo a achar que ainda são seres demasiado dependentes e indefesos para ficarem sem a mãe/pai durante 6 horas =( já para não falar de nós que dormir de noite não é comum...!

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  7. Muitos parabéns pelo estado de graça e sei perfeitamente do que fala. Passei por isso tudo. Custou muito gerir a segunda gravidez com o mais velho ainda pequenito, mas tudo passou e estamos cá todos felizes para contar a história.
    Desejo-lhe toda a força e coragem para levar tantos e tão lindos projectos a bom porto.
    Felicidades!

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  8. Olá Filipa, sou uma das suas novas seguidoras, pois tive conhecimento do seu blog com a noticia de que estava a dar o seu livro. Desde já agradeço o envio do mesmo e felicito-a pelo gesto simpático que teve.
    Também sou mãe, apenas de um menino de 14 meses, mas gostaria muito de ter outro. Ao contrário de si, sou "fã da coisa" embora não perceba porquê, pois não foi nem continua a ser nada fácil. A gravidez não foi fácil e as noites mal dormidas continuam dia após dia... mas o seu sorriso faz-me recordar que sou uma mulher feliz e realizada. O mesmo lhe irá acontecer a si, por mais que tenha medo de voltar a passar por toda uma situação penosa para si, o desejo de ser mãe fala mais alto e quando olhar para os seus tesouros irá concluir que tudo valeu a pena. Somos MULHERES, somos mesmo assim, mais fortes do que julgamos. Desejo-lhe as maiores felicidades.

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  9. Tenho um de 8 meses e cá vem o segundo a caminho!
    Bem... não sei se queria ter lido este post ;)

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  10. Eu tenho dois filhos com 2anos e 8 meses de diferência na idade e na verdade ao nascer é muito mais facil o 2 filho. Muitos temores já tenden a desaparecer e tudo quanto se aprendio com o primeiro filho faz muito melhor a atenção do mais novo porque já sabemos como fazer as coisas, como mães expertas: como saiber por que é que chora o menino e os medicamentos o a atenção que dar. Asim que muito ánimo que os mais pequeninos dam muita maior felicidade e menos trabalho

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  11. Olá Filipa,
    Antes de mais muitas felicidades e parabéns pelo seu estado de graça.
    Como pai conheço a versão masculina do seu desabafo, no que respeita a termos que ter uma dose suplementar de paciência e cara alegre, quando uma ou mais das seis mulheres que mencionou, requerem atenção, carinho, amor ou se irritam pelos motivos mais incríveis, ficam implicativas e rabugentas ou exigentes durante os imensos nove meses. (Além do período de abstinência antes e depois do nascimento...para nós é duro). Há muitas ligações que não resistem a esta verdadeira prova de fogo.
    Agora quando realmente existe Amor no casal, é impossível não amar aquela mulher, que tal como uma borboleta, se transforma à nossa frente de dia para dia, enquanto vai criando uma nova vida que leva um pedaço de nós no caminho da eternidade.
    Não existe nada superior ao milagre da vida e bem lá no fundo que inveja temos de só podermos ser um espectador nessa criação.
    Muitas Felicidades e uma hora pequenina.
    Beijinho
    Paulo Pereira

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    1. Obrigada Paulo pelo seu testemunho de pai :) um beijinho

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  12. Obrigada a todos pelos vossos comentários e felicitações. :) um beijinho

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