Há vida para lá do vale
Ouvi dizer que a Apple e o Facebook anunciaram que vão financiar o congelamento de óvulos para que as suas funcionárias possam adiar a maternidade.
(Pausa.
Pausa de incredulidade, de indignação, de estupefacção.)
É das coisas mais assustadoras e ignóbeis que li em toda a minha vida. Aliás, enquanto mãe e mulher, é tão revoltante, que me apetece deitar o Mac onde estou a escrever pela janela fora e apagar todas as minha contas do Facebook.
Segundo os defensores desta nova modinha de Silicon Valley, a medida permite que as mulheres dediquem os melhores anos da sua vida às suas carreiras, alcançando cargos nunca antes imaginados, até agora dominados por homens, podendo mais tarde (provavelmente aos 50, porque não?) abrandar o ritmo e ter filhos. É um procedimento caro, que não está coberto por seguros de saúde e, no fundo, os "beneméritos" estão a fazer um favor e a incentivar a natalidade, ainda que geriática.
Ora, eu sei que os produtos criados por estas empresas são (supostamente!) facilitadores da vida moderna. O telefone que é um computador, o relógio que dá música, o tablet que armazena bibliotecas inteiras, a rede social que nos faz estar a par de tudo o que os nossos amigos andam a fazer, as aplicações e todas as distracções que nos estão a tornar cada vez menos humanos, cada vez menos sociais. Mas sabem de uma coisa caros senhores de Silicon Valley? Não precisamos que interfiram nos nossos ciclos reprodutivos.
Se querem realmente contar com as mulheres nas vossas empresas podem começar por lhes pagar o mesmo que pagam aos homens. Com um salário melhor, as mães não têm de sacrificar a carreira para dar atenção aos filhos. Porque podem pagar a uma empregada para lhes orientar a casa, a roupa e a cozinha; podem contratar uma ama para tomar conta das crianças nos dias em que têm de ficar até mais tarde; podem escolher uma casa perto do local de trabalho, para poupar o tempo de deslocações e assim terem mais horas livres para o seu cargo e para as crianças. Depois podem usar o dinheiro dos óvulos e usá-los para pagar as licenças de maternidade prolongadas, ou os dias em que temos de faltar porque os miúdos estão doentes ou têm a festa da escola. Por último, podem mesmo criar creches e ATLs no edifício, para que as mães não tenham de sair a correr de uma reunião porque a escola vai fechar e ninguém foi buscar o miúdo. Tal como criam refeitórios, ginásios e, no caso da nova sede do Facebook, canil! Com todo o respeito e amor que tenho por animais, construir um canil e não construir uma creche é o mesmo que dizer "aqui só queremos solteirões sem vida, cujo único ser vivo com quem contactam para lá da porta do escritório tem quatro patas".
Em pleno século XXI, o tipo de mentalidade por detrás desta medida é aterrorizador. O corpo humano não é software sujeito a actualizações. A seguir vão programar o sexo dos filhos conforme as necessidades demográficas? Ou financiar a eutanásia para quem tem a seu cargo familiares debilitados? Saiam mas é de trás dos vossos computadores e abram os olhos. Olhem-se ao espelho e vejam os monstros em que se tornaram. Autómatos. Vazios. Olhem pela janela e reparem em algo de expraordinário: há vida para lá do vale onde só a tecnologia se desenvolve. Há vida, há valores, há humanidade. Acima de tudo, há a melhor coisa do mundo: as crianças.
(Pausa.
Pausa de incredulidade, de indignação, de estupefacção.)
É das coisas mais assustadoras e ignóbeis que li em toda a minha vida. Aliás, enquanto mãe e mulher, é tão revoltante, que me apetece deitar o Mac onde estou a escrever pela janela fora e apagar todas as minha contas do Facebook.
Segundo os defensores desta nova modinha de Silicon Valley, a medida permite que as mulheres dediquem os melhores anos da sua vida às suas carreiras, alcançando cargos nunca antes imaginados, até agora dominados por homens, podendo mais tarde (provavelmente aos 50, porque não?) abrandar o ritmo e ter filhos. É um procedimento caro, que não está coberto por seguros de saúde e, no fundo, os "beneméritos" estão a fazer um favor e a incentivar a natalidade, ainda que geriática.
Ora, eu sei que os produtos criados por estas empresas são (supostamente!) facilitadores da vida moderna. O telefone que é um computador, o relógio que dá música, o tablet que armazena bibliotecas inteiras, a rede social que nos faz estar a par de tudo o que os nossos amigos andam a fazer, as aplicações e todas as distracções que nos estão a tornar cada vez menos humanos, cada vez menos sociais. Mas sabem de uma coisa caros senhores de Silicon Valley? Não precisamos que interfiram nos nossos ciclos reprodutivos.
Se querem realmente contar com as mulheres nas vossas empresas podem começar por lhes pagar o mesmo que pagam aos homens. Com um salário melhor, as mães não têm de sacrificar a carreira para dar atenção aos filhos. Porque podem pagar a uma empregada para lhes orientar a casa, a roupa e a cozinha; podem contratar uma ama para tomar conta das crianças nos dias em que têm de ficar até mais tarde; podem escolher uma casa perto do local de trabalho, para poupar o tempo de deslocações e assim terem mais horas livres para o seu cargo e para as crianças. Depois podem usar o dinheiro dos óvulos e usá-los para pagar as licenças de maternidade prolongadas, ou os dias em que temos de faltar porque os miúdos estão doentes ou têm a festa da escola. Por último, podem mesmo criar creches e ATLs no edifício, para que as mães não tenham de sair a correr de uma reunião porque a escola vai fechar e ninguém foi buscar o miúdo. Tal como criam refeitórios, ginásios e, no caso da nova sede do Facebook, canil! Com todo o respeito e amor que tenho por animais, construir um canil e não construir uma creche é o mesmo que dizer "aqui só queremos solteirões sem vida, cujo único ser vivo com quem contactam para lá da porta do escritório tem quatro patas".
Em pleno século XXI, o tipo de mentalidade por detrás desta medida é aterrorizador. O corpo humano não é software sujeito a actualizações. A seguir vão programar o sexo dos filhos conforme as necessidades demográficas? Ou financiar a eutanásia para quem tem a seu cargo familiares debilitados? Saiam mas é de trás dos vossos computadores e abram os olhos. Olhem-se ao espelho e vejam os monstros em que se tornaram. Autómatos. Vazios. Olhem pela janela e reparem em algo de expraordinário: há vida para lá do vale onde só a tecnologia se desenvolve. Há vida, há valores, há humanidade. Acima de tudo, há a melhor coisa do mundo: as crianças.
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